Em 02.06.2023, o Supremo Tribunal Federal (“STF”) finalizou o julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5835 (“ADI 5835”) e, por ampla maioria (8x2), declarou a inconstitucionalidade do deslocamento do recolhimento do ISS ao município do tomador nos serviços previstos na Lei Complementar nº 157/2016 (“LC 157”).
Entre outras mudanças, a LC 157 havia determinado que o ISS incidente sobre serviços de administração e gestão de fundos de investimento, planos de saúde ou assistência médico-veterinária, administração de consórcios, cartões, carteiras de clientes ou cheques pré-datados e arrendamento mercantil passasse a ser recolhido ao município do tomador do serviço.
A norma já estava com sua eficácia suspensa desde 23.03.2018, em razão da Medida Cautelar deferida pelo Ministro Alexandre de Moraes, relator da ADI 5835. Posteriormente, foi editada a Lei Complementar nº 175/2020 (“LC 175”), que buscava sanar as lacunas da LC 157 e criar um sistema nacional para recolhimento do ISS.
Abaixo, detalharemos as posições manifestadas pelo STF nesse julgamento.
Posição Vencedora
A corrente vencedora foi capitaneada pelo Ministro Alexandre de Moraes, que, em seu voto, sustentou a inconstitucionalidade do deslocamento do recolhimento do ISS para o domicílio do tomador dos serviços previstos na LC 157 com base nos seguintes argumentos:
(a) a alteração na sistemática de recolhimento do ISS promovida pela LC 157 ofendeu o Princípio da Segurança Jurídica ao deixar de esclarecer o conceito de “tomador de serviços”;
(b) a falta dessa definição contribuiu para a existência de atos normativos municipais colidentes, que causariam conflitos de competência, com possibilidade de dupla tributação ou incorreta incidência do ISS;
(c) as falhas na LC 157 ficaram mais claras com a edição da LC 175, a qual só perpetuou imprecisões na determinação do domicílio do tomador do serviço; e
(d) os dispositivos da LC 175, que instituíram o padrão nacional de obrigação acessória do ISS, estão diretamente vinculados à mudança na competência para cobrança do ISS, sendo igualmente inconstitucionais.
Em tese, essa linha argumentativa não impede futuras iniciativas legislativas que pretendam deslocar o local do recolhimento do ISS. Isso porque, no entendimento do relator, a Constituição não definiu para qual município o ISS deve ser recolhido, cabendo à Lei Complementar dispor sobre a matéria. A grande questão é que essa eventual legislação deve ser suficientemente clara e precisa para evitar conflitos de competência, diferentemente do que ocorreu com a LC 157 e a LC 175.
Vale mencionar que, embora a ação tenha questionado o deslocamento do recolhimento do ISS apenas em relação a alguns dos serviços objeto da LC 157, o STF julgou inconstitucional também o deslocamento do recolhimento em relação a serviços de exploração florestal e afins, vigilância e segurança de bens e pessoas e transporte municipal.
Acompanharam o relator os Ministros André Mendonça, Edson Fachin, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e Carmen Lúcia.
Posição da Divergência
O Ministro Nunes Marques divergiu do relator para declarar a constitucionalidade das alterações da LC 157 e da LC 175, no que foi seguido pelo Ministro Gilmar Mendes.
Para tais ministros, embora a LC 157 contivesse lacunas que impediam sua aplicação, a LC 175 teria sanado esses defeitos e permitido a operacionalização da mudança do local de recolhimento do ISS ao criar um sistema nacional unificado para este fim.
Efeitos do Julgamento do STF
O STF não modulou os efeitos da inconstitucionalidade do deslocamento do recolhimento do ISS. Dessa forma, os dispositivos contestados não produzem quaisquer efeitos desde a sua criação.
Embora o acórdão ainda não tenha transitado em julgado, consideramos remota a chance de qualquer mudança substancial no julgamento do mérito ou na modulação de efeitos. A única modificação que se apresenta razoável é a limitação da declaração de inconstitucionalidade aos serviços efetivamente questionados na ADI 5835, uma vez que a decisão acabou por abranger serviços que não foram objeto da petição inicial (exploração florestal e afins, vigilância e segurança de bens e pessoas e transporte municipal).
Com isso, os prestadores de serviços que seriam afetados pela mudança no local de recolhimento do ISS, a exemplo dos administradores e gestores de fundos de investimento, podem, a depender do caso concreto:
(a) recuperar valores eventualmente pagos aos municípios dos tomadores de serviços nos últimos 5 anos; e/ou
(b) estar sujeitos à cobrança do imposto pelos municípios em que estão estabelecidos, caso tenham deixado de recolher o imposto durante a vigência da LC 157.
A equipe Tributária do FreitasLeite está à disposição para prestar mais informações.