Em 29.12.2023, foi publicada a Lei nº 14.789/2023, resultado da conversão em lei da Medida Provisória nº 1.185/2023, que conferiu um novo tratamento fiscal para as subvenções concedidas pela União, Estados, Distrito Federal ou Municípios para implantar ou expandir empreendimento econômico. A norma também alterou a forma de cálculo dos juros sobre o capital próprio (“JCP”) e regras pontuais na tributação de entidades offshore.
Abaixo, apresentaremos os pontos mais relevantes da nova legislação.
1. Crédito Fiscal Decorrente de Subvenção para Investimento
A tributação das receitas decorrentes de subvenções foi objeto de diversas controvérsias ao longo dos anos e remonta ao final da década de 1970, quando a legislação tributária passou a autorizar a exclusão das subvenções para investimento da apuração do lucro real das empresas.
Essa possibilidade foi mantida pela Lei nº 12.973/2014, que determinou que as receitas de subvenções para investimento (i) poderiam ser excluídas da base de cálculo do IRPJ e CSLL, desde que atendidos determinados requisitos legais relacionados à contabilização e destinação dos recursos decorrentes de benefícios fiscais; e (ii) não integram a base de cálculo do PIS e da COFINS.
Desde então, foram instaurados embates sobre a correta classificação dos mais diversos tipos de benefícios fiscais:
(a) subvenções para investimento: aquelas destinadas a finalidades específicas, em especial a implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, e que podiam ser excluídas do lucro real e das bases de cálculo do PIS e da COFINS;
(b) subvenções para custeio: caracterizadas por não terem uma finalidade específica e serem tributadas pela empresa beneficiária.
Esse volumoso contencioso inspirou a edição da Lei Complementar nº 160/2017, que equiparou todos os benefícios fiscais de ICMS a subvenções para investimento, independentemente da finalidade do benefício, a fim de afastar a tributação sobre tais valores.
A despeito da tentativa de pacificação legal, a Receita Federal continuou a entender que apenas as subvenções concedidas com finalidade específica de manutenção ou expansão de empreendimentos econômicos poderiam escapar da incidência do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, o que evitou que se pusesse fim às discussões.
Já em âmbito judicial, enquanto a controvérsia relativa ao PIS e à COFINS aguarda julgamento no STF (RE nº 835.818), o STJ consolidou dois entendimentos relevantes sobre o tema para fins de IRPJ e CSLL:
(a) créditos presumidos de ICMS são por essência excluídos da incidência do IRPJ e da CSLL, independentemente de qualquer previsão legal (EREsp nº 1.517.492);
(b) demais benefícios fiscais não são excluídos por essência da incidência do IRPJ e da CSLL, de modo que essa exclusão depende de previsão legal específica e está sujeita às condições estabelecidas em Lei (REsps nºs 1.945.110 e 1.987.158).
Agora, a Lei nº 14.789/2023 instaura um novo regime fiscal a ser aplicado às receitas de subvenção para investimento auferidas a partir de 01.01.2024, sendo ressalvado o tratamento anterior para as receitas auferidas até 31.12.2023.
Nesse novo regime, as receitas de subvenção para investimento passam a ser integralmente tributadas pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. A nova legislação não faz qualquer ressalva quanto aos créditos presumidos de ICMS, em contrariedade à jurisprudência do STJ sobre o assunto.
Por outro lado, a empresa beneficiária de subvenção para investimento poderá apurar crédito fiscal equivalente a 25% das suas receitas de subvenção para investimento, desde que essas receitas:
(a) sejam relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão ou de locação ou arrendamento de bens de capital, relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico; e
(b) tenham sido computadas na base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Para fazer jus ao crédito fiscal, que poderá ser utilizado para compensar débitos federais próprios ou ser ressarcido em dinheiro, a empresa deverá cumprir as seguintes exigências previstas na Lei nº 14.789/2023 e regulamentadas pela Instrução Normativa RFB nº 2.170/2023:
(a) solicitar a habilitação por meio eletrônico no Centro Virtual de Atendimento (“e-CAC”) da RFB;
(b) ser tributada pelo lucro real;
(c) ser beneficiária de subvenção para investimento;
(d) possuir ato concessivo da subvenção anterior à implantação ou à expansão do empreendimento e que estabeleça expressamente as condições e as contrapartidas a serem observadas pela pessoa jurídica;
(e) ter aderido ao Domicílio Tributário Eletrônico – DTE; e
(f) estar regular com relação a débitos de tributos e contribuições federais.
Além de tratar das receitas de subvenção auferidas a partir de 01.01.2024, a Lei nº 14.789/2023 também prevê a possibilidade de adesão do contribuinte à transação tributária em relação a débitos relativos a receitas de subvenção anteriores a essa data, com possibilidade de parcelamento e aplicação de descontos sobre o valor dos débitos.
2. Apuração da Base de Cálculo do JCP
O JCP é instrumento financeiro que tem como objetivo remunerar o sócio pelo seu capital investido na empresa. O pagamento do JCP tem como vantagem para as empresas a sua dedutibilidade da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, por ser considerado uma despesa. Segundo as regras estabelecidas pela Lei nº 9.249/1995, o valor de JCP a ser deduzido corresponde, em regra, à aplicação da variação pro rata die da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) sobre determinadas contas do patrimônio líquido (PL), observados os limites previstos na Lei.
A Lei nº 14.789/2023 restringiu as contas do PL que servem de base para o cálculo do JCP, de modo que a partir de 01.01.2024 os JCP não poderão ser calculados sobre os seguintes elementos do patrimônio líquido:
(a) capital social não integralizado;
(b) reservas de capital que não correspondam ao ágio na emissão das ações;
(c) reservas de lucros correspondentes a incentivos fiscais; e
(d) variações positivas no patrimônio líquido decorrentes de atos societários entre partes dependentes que não envolvam efetivo ingresso de ativos à pessoa jurídica, com aumento patrimonial em caráter definitivo.
3. Tributação de Offshores – Opção pela Tributação Automática
Por fim, a Lei nº 14.789/2023 trouxe alterações pontuais na recém publicada Lei nº 14.754/2023, que alterou a tributação de empresas offshore controladas por pessoas físicas e a de fundos de investimento locais e foi abordada em detalhes no Informe que pode ser acessado aqui.
Entre essas alterações, destaca-se a possibilidade de o controlador de entidade offshore optar pela tributação automática dos rendimentos da controlada, mesmo nos casos em que a tributação automática não for obrigatória. Isso se aplica, por exemplo, ao controlador de entidade operacional que não está domiciliada em paraíso fiscal ou é beneficiária de regime fiscal privilegiado.
Essa alteração é relevante, porque possibilita ao controlador deduzir, no Brasil, o valor do imposto pago pela controlada no exterior. Com isso, a opção pela tributação automática poderá ser inclusive mais vantajosa ao controlador, já que a compensação do imposto pago no exterior poderá resultar na redução a zero do imposto que seria recolhido no Brasil.
Para mais informações, a equipe Tributária do FreitasLeite está à disposição.